Indústria pode ser setor mais impactado por Reforma Tributária, indica estudo
Presidente do Ciesp diz que Brasil vive hoje em um verdadeiro ‘manicômio tributário’.
Estudo faz simulações de como seria a economia brasileira se houvesse uma reforma tributária em nível nacional. (Foto: Unsplash)
O setor industrial poderá ser o mais beneficiado pela Reforma Tributária, segundo estimativa de um estudo apresentado durante o Congresso “Reforma Tributária - Repercussões Práticas”, promovido pelo Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) e pela Esagu (Escola Superior da Advocacia-Geral da União).
De acordo com a autora, a doutora em economia pela Universidade Federal de Minas Gerais Débora Freire, que hoje ocupa o cargo de subsecretária de Política Fiscal da Pasta de Política Econômica do Ministério da Fazenda, os serviços associados à indústria também tendem a estar entre as áreas mais impactadas pela reforma.
Segundo Débora, o objetivo era projetar impactos macroeconômicos, setoriais e distributivos de uma reforma tributária, utilizando a metodologia de Equilíbrio Geral Computável (EGC), que é aplicada na literatura internacional. O estudo basicamente fez simulações de como seria a economia brasileira se houvesse uma reforma tributária em nível nacional. Outros estudos estão em andamento com o mesmo objetivo, segundo ela.
“É como se eu pensasse num lago em que eu vá jogar uma pedrinha, que vai causar todo um efeito de espraiamento. Uma mudança grande, como essa reforma, tem capacidade de gerar impactos diretos e indiretos. Se eu uso métodos que não considerem esses impactos, eu capto apenas o primeiro ciclo, que é o do choque que a pedra gerou”, disse a economista.
De acordo com o estudo, ao eliminar a cumulatividade do sistema tributário, foi possível estimar um ganho acumulado no PIB de 4,14% entre dez e 15 anos.“A gente observa que o investimento é a variável que mais responde [à reforma tributária] e que mais explica esse ganho de PIB. Basicamente, o efeito de 16,4% no investimento mostra o alto custo de eficiência que o atual sistema tributário impõe ao investimento. Quando estamos falando da indústria, um setor que depende de investimentos de longa duração, a gente entende também porque ela é um dos setores mais penalizados atualmente pelo sistema tributário e porque é o setor que mais ganha com a reforma”, disse Débora.
Infraestrutura, Petróleo e Gás apontam insegurança
Apesar das estimativas positivas, o congresso apresentou inseguranças e questionamentos no setor industrial. Para o professor Marcus Lívio Gomes, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e pesquisador associado da Universidade de Londres, no caso das áreas de petróleo e gás, por exemplo, a reforma hoje deixa algumas dúvidas e se ressente da falta de marcos regulatórios firmes. “O texto, como está hoje implicaria em um aumento de cerca de 20% na tributação, o que mudaria a lógica dos investimentos não só em exploração, como também em desenvolvimento”, disse Gomes.
O livre docente em direito tributário da PUC-SP, Tacio Lacerda Gama, chamou a atenção para indefinições da lei em relação aos investimentos em infraestrutura, como as concessões públicas nas áreas dos modais de transporte e de saneamento básico.
Mais ousados
Durante a abertura do Congresso, Rafael Cervone, presidente do Ciesp, lembrou que a reforma tributária é um desejo de décadas do Brasil e afirmou que o país vive hoje em um “manicômio tributário”. O Ciesp representa cerca de oito mil indústrias de todo o estado de São Paulo.
Para ele, o Brasil está fazendo agora algo que os concorrentes [outros países] fazem todos os dias, que é um projeto de Estado e não um projeto de governo. Ele também ressaltou que a reforma tributária representará segurança jurídica, apesar de não ser a ideal. “É a reforma ideal. Claro que não. É a possível? É a possível. Mas, por trás disso, existe algo que o Brasil precisa corrigir, mudando o_mindset_, que é o fato de sempre nos acomodarmos com o que é o possível. Precisamos ser mais ousados”, disse Cervone.
Diálogo Rico
Para o diretor jurídico do Ciesp, Helcio Honda, o evento foi muito rico por ter reunido grandes palestrantes, como professores e magistrados, com destaque para os que vieram da Secretaria Especial da Reforma Tributária falando dos pontos que serão colocados nas Lei Complementar e que só serão divulgados nas próximas semanas. “Foi a primeira vez que o pessoal da Secretaria Especial da Reforma Tributária pôde comentar aspectos importantes da regulamentação da Reforma Tributária aprovada. O evento mostrou que o Ciesp está sempre muito antenado com os temas que vão impactar a economia e a indústria”, disse o diretor jurídico.
Para a procuradora da Fazenda Nacional e diretora adjunta da Esagu, Rita Dias Nolasco, responsável pela organização do evento, houve um debate democrático e muito qualificado sobre tema de grande relevância para o cenário econômico brasileiro. O local escolhido foi a “casa da indústria”, onde estão as empresas e empresários que geram grande parte dos empregos do país.
Nolasco ressaltou que a Reforma Tributária visa a redução dos litígios. Hoje no Brasil os cinco impostos gerais sobre consumo e serviços — PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS - são os que mais geram o contencioso tributário no país. Esses tributos serão substituídos pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), pela CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). O IBS e a CBS terão legislação única a ser aplicável em todo o território nacional. o IBS será compartilhado entre Estados e Municípios e CBS fica sob a competência da União, mas com regras constitucionais idênticas ao do IBS.
Segundo ela, um dos grandes desafios é a regulamentação do Comitê Gestor do IBS, cuja expectativa é de que a lei traga clareza, simplicidade, transparência, adequada gestão e operacionalização desse colegiado para garantir a almejada segurança jurídica.
O evento também abordou diversos temas de interesse para a indústria, como a regulamentação do imposto seletivo, incidente sobre bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
O Congresso contou com participação de especialistas e profissionais, com grande conhecimento e experiência de atuar diretamente com o universo tributário e que puderam trazer suas proposições para a regulamentação do novo sistema tributário. "O diálogo foi muito rico e o pessoal da Secretaria da Reforma Tributária (Sert) sai com excelentes sugestões para aprimorar as regulamentações e ampliar o debate com a sociedade e com os contribuintes”, disse Nolasco.
O evento também teve a participação direta do procurador da Fazenda Nacional Leonardo Alvim, que também coordenou o Programa de Assessoramento Técnico à Implementação da Reforma Tributária sobre o Consumo (PAT-RTC) do Ministério da Fazenda.
O evento contou com a participação do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, de deputados federais e secretários de Estado.