Joisa Dutra, FGV: Transição energética pode ajudar a reindustrializar, mas produtividade é entrave

Transição energética é aposta para reindustrialização no Brasil, mas mau desempenho da produtividade é entrave, e melhoras institucionais são essenciais.

Joisa Dutra_fgv_divulgaçãoJoisa Dutra é doutora em Economia pela Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro (2001), foi diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), entre 2005 e 2009. (Foto: Reprodução/FGV - IBRE)

Transição energética é aposta para reindustrialização no Brasil, e, para isso, atrair capitais chineses é parte da estratégia do governo. Mas mau desempenho da produtividade é entrave, e melhoras institucionais são essenciais.

No final do mês, o presidente Lula visita a China, acompanhado de uma megacomitiva, que inclui empresários, políticos, reguladores e ministros. O foco seria a atração de investimentos e modernização da indústria brasileira. Uma das grandes apostas para uma reindustrialização por aqui seria a transição energética. A elevada participação de energia limpa nas matrizes energética e elétrica é vantagem a ser explorada em um mundo de competição por baixo conteúdo de carbono.

Modernização da indústria é um bom começo. Mas outros ingredientes são necessários para produzir desenvolvimento sustentável, caminho que temos tido dificuldade de percorrer. Isso é o que apontam dados recentes do Observatório da Produtividade Regis Bonelli (OP). Depois de um breve “lapso” em 2020, o ano de 2022 exibe um retorno ao padrão de baixo crescimento da produtividade do período pré-pandemia. Essa variável é medida pela Produtividade Total dos Fatores (PTF), que considera não apenas a produtividade do trabalho, mas também a eficiência do capital. Nosso baixo nível de crescimento nesse quesito se estende por quase quatro décadas, desde 1981, o que aumenta a responsabilidade de desenhar e avaliar políticas na transição energética.

O impacto de políticas focadas em energia renovável sobre a descarbonização é tema de artigo recente publicado pelo Banco Mundial (Galeazzi e coautores, 2023). A amostra contém dados de 133 países em desenvolvimento – Brasil inclusive – ao longo de quase quatro décadas, entre 1980 e 2018. Esse período é basicamente o mesmo dos dados do OP. São investigados 76 instrumentos de política, agrupados em sete categorias como: arcabouço legal, planejamento da expansão de renováveis, incentivos e suporte regulatório, conexão e uso da rede, precificação de carbono, e risco de contraparte. E é esse último componente o que produz respostas mais rápidas, considerando uma defasagem de três anos desde a adoção das políticas.

O conjunto de políticas agrupado na categoria Risco de Contraparte representa o clima das finanças. Para ilustrar, inclui instrumentos de garantia pelo governo ou outras medidas da qualidade do risco e da “bancabilidade” dos projetos. Os autores interpretam que esses achados podem ser evidências de que a (falta de) capacidade institucional penaliza o potencial de mobilizar capitais nesses países.

A importância desses impactos não pode ser subestimada, principalmente considerando o período de análise. O Brasil tem enfrentado dificuldades para promover e sustentar crescimento, como evidenciam os dados do Observatório da Produtividade. Buscar parceiras e investimentos é crucial, ainda mais quando os parceiros estão entre os líderes em tecnologias e controle de recursos vitais para a transição energética, caso da China.

A missão a esse gigante oriental, antecedida pela visita do Presidente Lula aos EUA, reflete uma aposta em que capitais chineses poderão trazer crescimento industrial ao Brasil em troca também de segurança alimentar daquela população. Em um mundo multipolarizado, a aposta na nossa capacidade de atrair capitais para tecnologias que enderecem a mudança climática não deve deixar de lado o conceito de um bom ambiente de negócios. Afinal, o desenvolvimento de uma indústria dinâmica e moderna requer mecanismos de financiamento que sigam melhores práticas internacionais, abordagem de riscos e clareza na direção da transição energética no país. Nesse caso, errar custa caro e atrapalha. Bom pensar nisso – e sopesar as possíveis consequências negativas – na hora de atacar temas como independência das agências reguladoras, governança das estatais e privatização da Eletrobras.