Conheça a origem, os nomes e os sabores do whisky
De destilarias primitivas nos séculos passados à bebida luxuosa dos filmes, livros e bares mais conceituados do mundo, o whisky é uma enciclopédia de sabores, histórias e memórias. Prepare seu copo e viaje conosco.
Conheça a origem, os nomes e os sabores do whisky. (Foto: Clube do Barman)
Como todo bom cocktail, cada destilado tem uma história para contar. No caso do whisky, não seria diferente. Sua história é milenar, começa no Oriente e ganha notoriedade na Europa antes de conquistar o coração e o paladar de pessoas em todos os continentes. Porém, o whisky é, antes de tudo, um fenômeno cultural. Retratado em filmes sempre exalando luxo e uma solidão ímpar, a preparação da bebida passa longe dessa percepção. Em uma única garrafa, o whisky traz uma aula sobre a história do mundo.
As origens
Datada de 1494, uma carta do rei da Escócia, James IV, pedia uma quantidade exorbitante de uisge beatha para que John Dor, um frade da região, produzisse. Mas o interessante, aqui, é todo o contexto. O que aconteceu até 1494 para que a um frade
escocês fosse demandada a produção de mais de mil litros de “aqua vitae”, como os monges chamavam em latim – que significa "água da vida" na tradução literal para o português?
A origem do whisky possui paralelos muito interessantes e simbólicos com a história do continente europeu. Como se sabe, no século 8 d.C, houve uma intensa e famosa invasão árabe em toda Península Ibérica e a região do Mar Mediterrâneo. Uma guerra que perdurou anos e anos e deixou traços culturais na Europa até a atualidade. Sendo o Mediterrâneo a principal porta de entrada e saída da Europa e a única rota de passagem conhecida do Ocidente para o Oriente, com esse domínio da Península Ibérica os árabes praticamente controlavam o mundo. E o que isso significava, além de um pleno domínio econômico? Domínio cultural e científico. Toda a região agora controlada pelos árabes era uma verdadeira área de trocas culturais e científicas dos mais diferentes povos e etnias.
Os orientais dominam a destilação há muitos séculos. O conhecimento foi utilizado no desenvolvimento do que hoje conhecemos como whisky. (Foto: Clube do Barman)
Apesar de ainda misterioso, é um consenso que o conhecimento da destilação e produção do que mais tarde viria a ser chamado de whisky provavelmente venha, de fato, do Oriente. Há registros em livros da Índia, Irã e Iraque – que, na época, não eram ainda países - mostrando a preparação de uma bebida com os mesmos ingredientes do whisky convencional. Os produtores? Monges das regiões montanhosas da Ásia. Dessa maneira, com as fronteiras para o Ocidente abertas, esse saber se proliferou. E chegou à outra ponta da Eurásia – o Reino Unido e, mais especificamente, a Irlanda e a Escócia.
Assim, ao fazer esse recorte espaço-temporal, é possível chegar a uma conclusão. O modo de preparo do whisky teria saído do Oriente por volta do século 8 d.C; muitos anos se passaram; guerras e mais guerras aconteceram; rotas de comércio foram traçadas, novas trocas culturais surgiram até que, quase 700 anos mais tarde, um rei escocês pedisse para um religioso preparar 1.200 litros de uisge beatha – o famoso whisky.
Assim como a preparação do destilado, sua história também é um verdadeiro exercício de raciocínio lógico e matemático.
O Whiskey com E e sem o E do outro lado do Oceano
Se o whisky chegou ao Reino Unido na virada do século XV para o XVI, era apenas uma questão de tempo para que conquistasse o resto do mundo.
Com uma nova rota comercial “descoberta” – as Américas – a bebida logo chegou por esses lados. Primeiro foi nos EUA e no Canadá, onde ingleses revoltosos se refugiaram. Inclusive essa história se confunde bastante com a introdução do gin nas Américas, narrativa que você pode ler melhor nesta matéria.
Whisky, a água da vida. (Foto: Clube do Barman)
E os EUA, povo historicamente protestante – seja na religião ou na cultura – mas nem todo puritano, logo se aventurou na arte da preparação do whiskey. Por conta de sua
geografia e características geológicas, os Estados Unidos são um país produtor de grãos – desde trigo, centeio e até o milho. E o whisky americano é produzido com grãos, unido o útil ao agradável.
A produção do whiskey se popularizou rapidamente em território norte-americano. Isso posto, pode-se dizer que essa estrutura toda encontrada na América do Norte foi o embrião para a criação de mais um tipo de whiskey: o whiskey americano. Um de seus principais representantes é o Bourbon, produzido apenas nos EUA e tendo o milho como principal componente.
Apesar de ser produzido majoritariamente a partir milho e outros grãos com adição de centeio, o rye whisky do Canadá, chamado canadian whisky, não leva a letra ‘e’ no nome.
O Whisky sem E do outro lado do mundo
Alguns registros dizem que a bebida chegou em solo japonês em 1918, levada por um químico de nome Masataka Taketsuru. A origem? A Escócia, é claro. Masataka havia cruzado metade do planeta Terra apenas para estudar sobre a produção do whisky. Como era possível sentir, em uma única garrafa, tantos sabores? Estudou, observou, degustou. E decidiu: levaria a bebida à sua terra natal.
Com grande influência das destilarias escocesas, o whisky chegara ao Japão com pompas. Não era um período tranquilo para o mundo, porém. Eram os anos entre guerras, uma época de muitas incertezas e nervosismo. Mas feliz ou infelizmente, é justamente nesse momento em que uma nova bebida gosta de se proliferar.
Você pode estar se perguntando nesse momento: por que é que cada hora se escreve de uma maneira? Whisky, Whiskey, Uísque? Por que em cada lugar é escrito ou falado de uma maneira? O que está acontecendo? Cada nome será explicado mais adiante.
Diferentes nomes de uma mesma bebida
Com o potencial econômico e principalmente alimentício que tem o whisky, era apenas uma questão de tempo para que diferentes regiões do mundo se aventurassem na sua produção. Além disso, se tem uma bebida alcoólica burocrática, é essa! Cada local, cada barril, cada ingrediente possui uma característica própria que você irá perceber ao provar.
E, na realidade, isso torna o seu gole de whisky muito mais interessante. Saber a história por trás da bebida que está em seu copo, todos os ingredientes usados para chegar naquele sabor específico, todas as rotas comerciais usadas para que os componentes chegassem à destilaria, todos os contratos assinados para que essas rotas pudessem ser usadas...tudo isso é história: e está dentro do seu copo!
Que tal preparar um Whisky Sour com seu rótulo favorito. (Foto: Clube do Barman)
Portanto, se cada barril de destilação é um universo a ser descoberto, torna-se óbvio que a denominação em cada país também seja um universo à parte. Não há, contudo, uma explicação única sobre porquê cada país escolheu chamar de uma maneira.
Whisky: Escócia, Japão, Brasil e Canadá;
Whiskey: Irlanda e EUA.
Uísque: apenas a tradução “abrasileirada”.
É certo que o idioma de cada lugar influencie na maneira como um destilado é chamado em determinado local. Partindo-se do nome latino aqua vitae, água da vida, temos uma expressão inicial “uisge beatha”, que vem do idioma gaélico, língua do povo Celta – que ocupava a região norte do Reino Unido há milhares de anos.
Na Irlanda, não se dizia uisge, mas uisce. Desses, surgiram os nomes Whisky/Whiskey dos primeiros produtores, a Escócia e a Irlanda (não necessariamente nesta ordem). A escolha de cada país subsequente pode ser mais fácil de entender do que parece.
Os EUA, por exemplo, é um país forjado no protestantismo. A Irlanda é um país dividido religiosamente: católicos de um lado, protestantes do outro. Além disso, o tráfego de irlandeses para os EUA e de americanos para a Irlanda foi algo recorrente a partir do século XVII – com efeitos dessa troca cultural vista até hoje (Boston Celtics, time da NBA e o St. Patricks Day, comemorado nos EUA). Resultado: nos EUA e na Irlanda é Whiskey.
Já o Japão, Brasil e Canadá tiveram o contato com o whisky a partir da Escócia. Em terras tupiniquins, inclusive, data de 1850 o primeiro registro histórico da bebida em nosso território, a pedido do próprio Imperador D. Pedro II.
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