Alta de posts negativos sobre Amazônia precede surto de desmatamento
Estudo avaliou modelos de inteligência artificial para prever destruição da floresta com base em atividade do X (antigo Twitter).
Estudo avaliou modelos de inteligência artificial. (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Seis dias depois de uma onda de comentários desfavoráveis com a palavra “Amazônia” no X (antigo Twitter), ocorreu um pico de desmatamento na região. Em um padrão parecido, uma alta de focos de incêndios amazônicos foi registrada após um surto de posts favoráveis sobre “queimadas”.
Ao estudar o impacto na destruição ambiental decorrentes da atividade política na rede social, rebatizada de X, os pesquisadores Vinicius Picanço Rodrigues e Marco Antonio Caetano, do Insper, exploraram meios de prever, para eventualmente prevenir, esse dano ambiental e social.
O pressuposto é que a exploração intensiva das redes sociais por políticos populistas não se restringe a estimular o engajamento de militantes. Os discursos e a sua repercussão, não raro por meio de mecanismos automáticos como robôs, favorecem ações concretas na vida real.
Rodrigues e Caetano consideraram o período do governo Jair Bolsonaro (2019-2022), em especial durante a pandemia de coronavírus, para avaliar a relação entre a circulação de mensagens no Twitter, de um lado, e a ocorrência de desmatamento e incêndios na Amazônia, de outro.
Dados diários do chamado “sentimento” — as tendências favoráveis ou desfavoráveis dos posts em torno dos termos “queimada”, “Amazônia” e “desmatamento” — foram classificados depois de extraídos do Twitter. Informações também diárias de desmatamento e incêndios florestais vieram do sistema satelital Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Fechando foco no período de agosto a outubro de 2020, o cruzamento entre essas duas séries de dados, no caso de manifestações negativas sobre “Amazônia”, mostrou que um pico de comentários precedeu em seis dias um pico de desmatamento, com 70% de correlação entre o que se escreve na rede social e o ato da destruição em si.
Um desses picos de comentários negativos eclodiu, revertendo tendência anterior, dois dias depois de uma fala do presidente da República, reiterada por seu ministro do Meio Ambiente, sobre a dificuldade de o fogo se espalhar em uma mata úmida como a floresta equatorial.
A análise da dupla de pesquisadores também encontrou um padrão semelhante na comparação entre sentimentos sobre “queimadas” e as ocorrências de incêndios florestais na Amazônia. Nesse caso, o número de focos de incêndio subiu dias depois de o sentimento positivo sobre queimadas no Twitter superar o negativo. Ele declinou após a tendência na rede se inverter.
O exercício de cruzar essas com outras palavras-chave — “agricultura” e “indústria” — nos posts mostrou, por exemplo, que uma alta em menções positivas sobre “agricultura” e “indústria” esteve correlacionada à elevação de comentários positivos sobre incêndios e desmatamento.
O achado dá uma pista sobre os temas que podem funcionar como gatilhos, muitas vezes deflagrados por líderes políticos, para incentivos a fogo e desflorestamento e, por meio desses incentivos, para as próprias ações danosas ao ambiente.
Os pesquisadores exploraram modelos de IA com base em aprendizado de máquina que possam ser bons preditores das elevações de incêndios, utilizando como insumos os dados coletados no Twitter. Em termos metodológicos, o modelo que se mostrou mais promissor, dadas as limitações de período e extensão das informações extraídas, foi o baseado no método de árvore de decisões.
(Fonte: Insper Conhecimento)