Ultra-regulamentação pode extinguir o home office

Projeto de Lei, em tramitação na Câmara dos Deputados, pretende regular o trabalho remoto.

Arthur Brant de CarvalhoArthur Brant de Carvalho, sócio da área Trabalhista do escritório Bussab Endres Brant Franco Ambrizzi Rosa Advogados. (Foto: Divulgação)

A Reforma Trabalhista de 2017, que introduziu o teletrabalho, foi sucinta e objetiva ao tratar das normas para segurança do trabalho. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deixou a cargo das partes a estipulação da responsabilidade quanto à aquisição da infraestrutura necessária e adequada para a prestação do trabalho remoto.

Porém, o artigo 75-D da CLT atribuiu ao empregador a obrigação de “instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho”. Em setembro de 2022, a publicação da Lei 14.442 regulamentou o teletrabalho, mas não fez menção às questões de segurança e saúde na modalidade.

Preocupado com essa questão, em 2023, o Ministério Público do Trabalho publicou uma norma técnica, CODEMAT N. 01/2023, visando subsidiar sua atuação em relação aos trabalhadores que laboram interagindo com meios telemáticos e informatizados.

Nela, há o alerta de que, para o teletrabalho, aplicam-se as regras da NR17, consistentes na ergonomia dos equipamentos (mesas, assentos, etc.) e no dever dos empregadores de garantir as mesmas condições de trabalho do modelo presencial.

“Atualmente, há um projeto de lei, nº 5581/2020, em trâmite perante a Câmara dos Deputados, que tem por objetivo regular o teletrabalho. Nele, há a previsão, inclusive, de visita in loco para examinar as condições de trabalho, questão que pode ser difícil de ser aplicada se considerar que há empresas que contratam em todo o país e fora dele”, comenta Arthur Brant de Carvalho, sócio da área Trabalhista do escritório Bussab Endres Brant Franco Ambrizzi Rosa Advogados.

Segundo o advogado, as normas existentes são suficientes para a regulamentação da modalidade de teletrabalho. A ultra-regulamentação pode trazer um engessamento tornando a adoção do home office, que beneficia tanto empregador quanto empregado, desinteressante.

Autuações do Ministério do Trabalho e Emprego

De um modo geral, as autuações do Ministério Público têm se mantido estáveis desde 2021, de acordo com o Portal da Inspeção do Trabalho. Em relação ao home office, o órgão pode fiscalizar o cumprimento das normas já existentes, particularmente quanto ao fornecimento de equipamentos ergonômicos a fim de prevenir doenças do trabalho. Porém, por se tratar de uma tarefa que exige uma fiscalização detalhada, caso a caso, até o momento, não se tem visto uma atuação específica do Ministério Público.

Desafios para empregadores

O trabalho remoto implica em, praticamente, transferir uma célula da empresa para a residência do funcionário.

“Quando falamos em uma classe média alta, que geralmente já dispõe em suas residências um local adequado, separado, iluminado para o trabalho, não vemos grandes dificuldades na adaptação e transposição do trabalho para o lar do empregado, mas esta, certamente, não é a realidade do brasileiro de uma forma geral”, comenta Arthur Brant.

Por vezes, o trabalhador reside em um local com poucos cômodos, sem um espaço adequado para as tarefas laborativas. Para este trabalhador, o que seria um benefício, pode se tornar um transtorno laboral, impactando, inclusive as suas atividades diárias e a rotina da sua residência.

O desafio dos empresários é entender a particularidade de cada empregado para verificar se o trabalho em home office será produtivo para ambas as partes e se a residência terá um ambiente saudável.

O trabalho em home office pode, também, limitar o convívio social do empregado com seus colegas, por isto, outro ponto importante é garantir, sempre que possível, um sistema híbrido, de modo que todas as partes possam se beneficiar do melhor de cada sistema.

O teletrabalho deve ser precedido de um bom aditivo contratual que contenha todas as previsões básicas, especificamente, quanto ao fornecimento de equipamento, mobiliário, custeio de internet, expediente etc. A adoção destes cuidados, com o acompanhamento de um profissional da área, irá mitigar os riscos da prática.